O tempo instável não desanimou nenhum pouco a dupla de palhaços “Terrô” (Matheus Barreto), “Disgraça” (Jhuann Scharrye) e sua assistente Carol Esteves na operação do grupo Circo Piorô e tão pouco a equipe da IV Mostra de Teatro Heliópolis. A rua Babalu, foi transformada num mini picadeiro e, conforme seu público estava chegando e aconchegando, timidamente e de olhos curiosos para o que estava prestes a assistir, eram muito bem recepcionados pela dupla cômica. O espetáculo Podia ser pior, foi apresentado no primeiro dia de novembro e dentro da programação da mostra.
Como um bom e corajoso espetáculo de rua, a relação direta com os transeuntes começa não só a fazer parte da receptividade daquelas pessoas, mas também a fazer parte do próprio espetáculo. Quando oficialmente se dá início a apresentação, de forma estratégica e pontual, as expectativas e relações já estão estabelecidas. Para isso, é prometido: “apenas um pedaço do espetáculo”, uma versão pocket, pois quem estava assistindo não merecia ver o show inteiro. É evidente que a dupla de palhaços, “Terrô” e “Disgraça” fizeram o oposto disso, nos proporcionando e nos deliciando com diversos números e risos para cada fragmento do completo espetáculo apresentado.
As crianças e adultos ficaram vidradas com as malabares (claves e facas), acrobacias, o “Nugets da Sadia” [menção a um pequeno boneco de frango] e até mesmo com uma prótese capilar. A pequena Maria Fernanda, que fazia parte do público, participou com muito entusiasmo de um dos números propostos no espetáculo e como recompensa ganhou a chave de um carro Gol 2006, somente a chave porque o carro a dupla não poderia dar, tudo parte da condução inteligente e dinâmica da dupla. Outro ponto que vale a pena destacar do espetáculo foi o momento de descongelamento do palhaço “Terrô”, onde um balde de “lama” [em seu lugar havia papéis picados] foi usado para “despertar” o palhaço, destacando e assimilando, de forma sutil, pontual e critica, com o rompimento da barragem de Brumadinho em Minas Gerais, não nos fazendo esquecer que a função do riso também é a reflexão.
O espetáculo Podia ser pior e a IV Mostra de Teatro Heliópolis nos fizeram esquecer do frio e nos proporcionou momentos mágicos, estabelecendo a espontaneidade necessária para um bom espetáculo de rua. A Companhia de Teatro Heliópolis, mais uma vez, faz ecoar sua responsabilidade e consciência social, ocupando e dialogando com os espaços urbanos e coletivos artísticos. Vida longa à Mostra.
Luiz Campos é ator, diretor e pesquisador teatral. É integrante fundador da Cia. Los Puercos e integrante do Grupo XVII de Teatro. Doutorando em Artes Cênicas pelo Instituto de Artes da UNESP e em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Mestre em Teatro pela Universidade Federal de São João Del-Rei (UFSJ) e graduado em Artes Cênicas pela Faculdade Paulista de Artes.